quinta-feira, 13 de junho de 2013


A reza não esbarrava. Uma hora o Dito chamou Miguilim, queria ficar com Miguilim sozinho. Quase que ele não podia mais falar. – “Miguilim, e você não contou a estória da Cuca Pingo-de-Ouro...” “ – Mas eu não posso, Dito, mesmo não posso! Eu gosto demais dela, estes dias todos...” Como é que podia inventar a estória? Miguilim soluçava. – “Faz mal não, Miguilim, mesmo ceguinha mesmo, ela há de me reconhecer...” “ – No céu, Dito? No céu?!” – e Miguilim desengolia da garganta um desespero. – “Chora não, Miguilim, de quem eu gosto mais, junto com mãe, é de você...” E o Dito não conseguia mais falar direito, os dentes dele teimavam em ficar encostados, a boca mal abria, mas mesmo assim ele forcejou e disse tudo: - “Miguilim, Miguilim, vou ensinar o que agorinha eu sei, demais: é que a gente pode ficar sempre alegre, alegre, mesmo com toda coisa ruim que acontece acontecendo. A gente deve de poder ficar então mais alegre, mais alegre, por dentro!...” E o Dito quis rir para Miguilim. Mas Miguilim chorava aos gritos, sufocava, os outros vieram, puxaram Miguilim de lá.

Miguilim doidava de não chorar mais e de correr por um socorro. Correu para o oratório e teve medo dos que ainda estavam rezando. Correu para o pátio, chorando no meio dos cachorros. Mãitina caminhava ao redor da casa, resmungando coisas na linguagem, ela também sentia pelo estado do Dito. – “Ele vai morrer, Mãitina?!” Ela pegou na mão de dele, levou Miguilim, ele mesmo queria andar mais depressa, entraram no acrescente, lá onde ela dormia estava escuro, mas nunca deixava de ter aquele foguinho de cinzas que ela assoprava. – “Faz um feitiço pra ele não morrer, Mãitina! Faz todos os feitiços, depressa, que você sabe...” Mas aí, no vôo do instante, ele sentiu uma coisinha caindo em seu coração, e adivinhou que era tarde, que nada mais adiantava. Escutou os que choravam e exclamavam, lá dentro de casa. Correu outra vez, nem soluçava mais, só sem querer dava aqueles suspiros fundos. Drelina, branca como pedra de sal, vinha saindo: - “Miguilim, o Ditinho morreu...”